"Nunca é alto o preço a pagar pelo privilegio de pertencer a si mesmo." Nietzsche

Dos verdadeiros heróis


imagem via internet

Naquele seu pranto, convulso, entre soluços dobrados e desesperadas puxadas de ar, enquanto as lágrimas escorriam de quatro em quatro... Ela me contava, apesar do sufoco, o quanto é perigoso ser uma sonhadora e porque não devemos depositar toda nossa confiança em alguém... Ela havia entendido que por melhor que seja uma pessoa, ela sempre vai nos decepcionar algum dia. Basta sabermos o grau de importância que esta pessoa tem para nós, para sabermos também, o tamanho da dor que iremos sentir por ela – quando isso acontecer, se acontecer.
Lembro-me de quando ela andava por aí se julgando tão forte e tão melhor que desprezava a possibilidade de ser atingida, gravemente, por simples palavras ou, até mesmo, pela falta delas. Esquecia-se que estava sujeita a ir parar a qualquer hora do dia, no seu quarto escuro, chorando na frente do espelho ou abafando o choro no travesseiro. E hoje, eu a vi assim: tão pequena e tão frágil - como uma criança contrariada, que só necessita de um abraço-apertado-de-urso e atenção.
Mas, tenho que admitir: a verdade é que ela é mesmo muito forte. Infelizmente, tombou feio dessa vez, quando lhe puxaram o tapete. Porém, de hoje em diante, ela estar preparada até pra sambar em cima dele, porque agora ela tem certeza que qualquer um pode puxá-lo. E tem aprendido a conserta-se cada vez mais rápido.
Ah, mesmo lamentando muito, ela me pediu para contar-lhes que, na verdade, não existem super-heróis. Ou, pelo menos, não são como nos desenhos animados. Eles nem sempre estarão ali para salvar a mocinha em perigo: pode ser que se atrasem ou, talvez, nem cheguem a tempo. Talvez, simplesmente, se esqueçam de que deveriam proteger alguém. Além de que ninguém irá puni-lo por isso. É que fora das estórias - do lado que moramos - ninguém tem obrigação de salvar ninguém. A única coisa que ainda levam as pessoas a isso, chama-se: Amor. (E nem todos o tem).
E quem não o tem?
           Acreditem: ela não se sentiu nem um pouco confortável ao me falar sobre isso. Até tenho a impressão de que a sua maior tristeza era justamente ter que seguir desacreditada quanto aos lindos contos e super-heróis. E ter que continuar sobrevivendo desse lado, onde todas as pessoas não passam de seres: amáveis, humanos e errôneos.
Por ela, essa descoberta também ficaria escondida no mais profundo de seu âmago, como todas as suas outras dores. Mas, prefere que estejamos preparados para sermos nossos próprios salva-vidas. Porque no final das contas, não há mais ninguém com quem possamos contar, o tempo todo, além de nós mesmos. E agora, em suas orações também pede para as pessoas tenham, além de cada vez mais amor, cada vez mais forças para enfrentarem seus dragões...

No final daquela noite, me lembrei daquela canção que ela sempre adorou ouvir e cantarolar, desde criança... Como se já soubesse que precisaria mesmo acreditar naquela canção pelo resto de sua vida. E como seu mais novo e único super-herói, apenas cantei baixinho, tentando acalmá-la até que dormisse...

“Ainda que vier, noites traiçoeiras
E a cruz pesada for... Cristo estará contigo.
O mundo pode até fazer você chorar
Mas Deus te quer sorrindo.”

4 comentários:

Fique mais um segundo... disse...

Oi, Indy, boa noite!!
Lindíssima crônica. Ainda mais que, escrita em terceira pessoa, é tão íntima da primeira, sugerindo-nos tão docemente que ambas possam até mesmo ser uma só mesma...
1 - Super-seres não passam de um super-engano, uma simples superilusão; quando a ilusão passa, sobre um super-pranto com que nos damos conta de quão frágeis somos.
2 - Entre as pessoas que conhecemos, há algumas que jamais vão nos decepcionar, mas isso não se sabe previamente. Só chegamos à conclusão de quais foram quando nossa vida se encerra. O jogo é este: algumas de quem até esperavamos decepção, a decepção jamais vêm; outras, entre as que "jamais nos trairão", vão nos trair por um doce. Como saber: viver para ver...
E chorar, sim. Chorar a decepção. Mas depois de regados os olhos e o rosto, entender o que aconteceu, entender que o único super-herói certo morreu numa cruz porque amou, porque ama; saber que também decepcionamos algumas pessoas.
Então, levantar a cebeça! E seguir...
Um beijo carinhoso
Doces sonhos
Leo

Lilo Moura disse...

Lembrei-me do Cazuza, quando ele dizia que: "Meus heróis morreram de overdose..." .. Eu acho que devemos mesmo é ter fé na gente... pra gente e sobre a gente.

tô contigo, mozão.

Beijo

Viviana Ruiz disse...

Nossa, que texto profundo hein... Muito emocionante eu diria, me vi em suas linhas, pois bem foi bastante inspirador.
Se cuide

T.S. disse...

E eu me senti aí descrita em tuas palavras!
Mas ainda prefiro continuar acreditando que tudo irá dar certo e o meu herói jamais falhará.

Beijos*: